Ao longo da história da freguesia destacam-se até final do século passado, quatro épocas bem distintas correspondentes a quatro fases de desenvolvimento da civilização portuguesa. Surgem-nos assim provas irrefutáveis e indícios de que pelo menos naquelas quatro épocas os povos que ocuparam a área hoje conhecida por Carapinheira deixaram vestígios, viveram e evoluíram com as limitações e progressos características do seu próprio tempo. Podemos considerar uma quinta época de desenvolvimento a que chamaremos o «ciclo do arroz», a qual praticamente coincide com o século XX.
Distinguimos assim, na primeira época, "Villa do Oleastro", hoje Alhastro, com as suas raízes romano-fenícias bem como o lugar de Lavariz ou Loveriz, resultante da "Villa Leoderici" (de Leodericos) e que parece ser de origem germânica no século X.
A reforçar a hipótese, segundo o parecer do Professor Moisés Espírito Santo devidamente explanado na sua obra: «Origens Orientais da Religião Popular Portuguesa, seguida de Ensaio sobre Toponímica Antiga», vamos encontrar numa região tendo por centro a povoação de Alhastro e um raio de 10 kms, uma «constelação» de topónimos todos de origem Fenícia ou Hebraica, tais como:
ZAMBUJAL – terra de Thamujos
CASAL DOS ALHOS – De alia (encosta, subida)
SANTA OLAIA ou SANTA OVAIA – polo de difusão da civilização fenícia na região do Baixo Mondego, segundo Veiga Ferreira.
ANAIA – de hanaia (escala, hospedaria)
SELÃO – de sela (pedra em hebraico)
CASAL SIMÃO – de Bal Seiman – Senhor Sol
ABADINHA – de Abadin (Pai Poderoso)
VALFORNO – de Baal Forno (O Senhor do Forno)
MOURA ou MOURÂO – de muron (alto)
CASAL D'ALÉM – de alia (subida, encosta)
FONTE DA MOIRA – Moira – os Fenícios teriam associado o conceito religioso da antiga Moira Grega à Deusa ISHTAR-ASTARTÉ, a partir do que este tem de fecundante, pródigo e fatal.
ISHTAR tinha assim os seus lugares de culto espalhados pela Lusitânea, e provavelmente nesta formosa encosta (Alia em Hebraico), onde se estende hoje a Carapinheira, era adorada e teria o seu templo, sendo designado o lugar por ALIA-ISHTAR, ou seja, a Encosta de ISHTAR ou Colina de ISHTAR. Da junção de ALIA-ISHTAR resultou muito facilmente o topónimo ALIA (ISHTAR) ou ALIASTAR, que segundo os professores Paulo Mêrea e Amorim Girão, foi o ALBIASTER dos mouros no século XI, para passar mais tarde a ser conhecida pelo Oleastro na Idade Média e depois Alhastro na atualidade.
Porém, como por outro lado no território ocupado pelos Fenícios na Ibéria, abundava a árvore chamada Zambujo, haveria uma identidade entre povo-Deus e árvore, a tal ponto que o Zambujo ou Zambujeiro era árvore sagrada entre os povos antigos.
Ora os Romanos designavam o Zambujo ou Zambujeiro por Oleastrum, planta da família das oleaginosas «Ólea Europea Oleaster», resultando assim o nome de Oleastro ou Olastro, que finalmente originou Alhastro.
É precisamente na Bética que nos surge a cidade de Oleastro e daí resulta o reforço à nossa tese das origens Fenício-Romanas do lugar do Alhastro.
Seja como for é a Vila de Oleastro, agora Alhastro, que perdurou ainda que na atualidade totalmente confundida como sendo a própria Carapinheira.
A primeira referência escrita sobre o Alhastro remonta ao século X. Efectivamente a Villa de Oleastrelo, como a de Tentúgal e Sendelgas pertenceram a Rodrigues Abulmundar, moçárabe que no ano 954 da era cristã as doou ao Abade Teodorico do Mosteiro do Lorvão, conforme reza o testamento. Pensa-se que D. Sisnando, grande senhor de Tentúgal e primeiro Conde de Coimbra sepultado na Sé Velha, tenha sido descendente de Abulmundar, porque apesar deste ter doado aquelas Vilas é D. Sisnando que vem herdá-las mais tarde, e até porque a doação não impedia a posse da terra pelos doados seus descendentes, desde que o mosteiro satisfizesse o encargo delas.
Não ficam por aqui outras opiniões sobre a Villa de Oleastro. Alguns historiadores têm mesmo considerado como sendo o Alhastro, a antiga Póvoa de Santa Cristina, hoje modesto lugar de Tentúgal mas outroura terra importante e sede do concelho, onde existiu um mosteiro franciscano, extinto em 1834 pelo Governo Liberal, assim como um pequeno concelho.
De facto, esta confusão, resulta do foral ou carta de foro atribuído simultaneamente por D. Afonso III em 26 de Setembro de 1265 à Póvoa de Santa Cristina e ao Olastro, como então se chamava.
Deixamos uma pequena transcrição do foral ou carta de foro: «Em nome de Deus saibam todos os presentes quantos futuros que eu Afonso pela Graça de Deus Rei de Portugal, juntamente com a mulher e Rainha D.ª Beatriz, filha do ilustre Rei de Leão e Castela e com os Meus Filhos e Filhas, o Infante D. Diniz e o infante D. Afonso e as Infantes D.ª Branca, D.ª Sancha e D.ª Maria, dou e concedo a Vós povoadores da minha Póvoa de Santa Cristina e de Olastro, tanto presentes como futuros o foro da minha Póvoa de Tentúgal, ou seja, que do monte me dêem a sexta parte do pão e de linho e do campo me dêem a quarta parte do pão e eirádega o carreto como dão os homens de Tentúgal e a quinta parte de linho com a sua eirádega. E que façam e tenham as vinhas e almoínhas pelo foro de Tentúgal. E todo o povoador de Santa Cristina e de Olastro dê, tanto na renda como na colheita, segundo o ganho que tiver, tal como dão os homens de Tentúgal...». (3)
Américo Costa defende que a Póvoa de Santa Cristina e Olastro se aglutinavam numa só povoação que se chamaria Santa Cristina de Olastro (Américo Costa, em Dicionário Corográfico de Portugal Continental e Insular), mas pelo texto facilmente se conclui pois que se trata de duas povoações distintas e não de uma só como defendem alguns historiadores. Em defesa da individualização da povoação do Olastro, na sequência da leitura da mesma carta de foro, vamos encontrar na relação das «Terras de Santa Cristina e Olastro» entre outros lugares, alguns que hoje se identificam com topónimos da Carapinheira, tais como: Vale de Ugio, donde resultou Vale Luzio ou Porto Luzio, Rego Pequeno ou Rego do Rei de hoje, junto à Bandorreira, e Barros Lavoradios por Bárrios do Loveriz ou Lavariz.
Concluímos pois que o Alhastro e a Póvoa de Santa Cristina, seriam nessa época, as povoações mais importantes entre Tentúgal e Montemor, dignas de terem regalias idênticas a estas duas Vilas.
A povoação do Alhastro, até à constituição da freguesia de Carapinheira fez parte integrante duma das cinco paróquias da própria Vila de Montemor que era conhecida por São Miguel. A freguesia de São Miguel era em 1364 do padroado régio.
Teve o Alhastro o seu cemitério com a Capela dedicada a São Pedro, no pequeno monte a este do atual campo de futebol da Carapinheira, até ao século XVII. É ainda no Alhastro que se ergue uma Capela chamada atualmente por Capela de Santo Amaro, reconstruída em 1692.
A posição da imagem de Senhora da Rosa ou de Santa Rosa no retábulo e o seu tamanho parecem indicar que estamos na presença do culto mais importante existente naquele templo. Na opinião do Prof. Moisés Espírito Santo, o seu culto mergulha na época pré-cristã. É idêntico ao culto da Senhora do Verde ou dos Prazeres e simboliza a aliança (Berit) e fidelidade mútua dos povos cananeu e hebraico, às respetivas divindades nacionais. Chega mesmo a concluir que tal culto se confunde com o culto mârranico de Santa Rainha Ester dos Cristãos Novos.
Mas não fica por aqui nas suas conclusões, diz mesmo que o culto mariano do Povo Português se confunde com o culto mariano de santa Rainha Ester, tendo em conta um certo paralelismo existente em a vida de Maria, Deus e Rainha dos Céus e da Terra, e a vida de Ester, conforme é descrita no Livro que tem o seu próprio nome.
Por último chega mesmo a afirmar que Ester não é mais que a Deusa ISHTAR ou Astarté a que nos referimos, a Deusa Mãe dos Fenícios e Cananeus, e como dissemos poderia estar na base da formação do topónimo Alhastro.
Diz ainda que este tipo de imagens marianas são frequentes no Distrito de Coimbra e, em particular, na Região de Montemor-o-Velho, estando relacionadas com a lenda ou mito do Abade João de Lorvão.
Assim, o Abade à frente dos defensores do Castelo de Montemor-o-Velho degolou as mulheres e as crianças por serem inúteis para a guerra, e poderem vir a colaborar com os Mouros no caso dos Cristãos serem vencidos. Várias Senhoras ter-se-iam solidarizado com as vítimas, ressuscitando-as e aparecendo elas também, com um fio de sangue ao pescoço, idêntico à cicatriz com que ficaram os ressuscitados.
Ora, este mito não é mais do que um mito Fenício da resistência ao Império Romano e, bem perto de Montemor, situa-se o referenciado castro fenício de Santa Olaia. Daí concluir que a Senhora degolada, ou Senhora do Verde, ou ainda Senhora da Rosa, é a OLAIA Fenícia.
Por vezes o Menino que a Senhora tem ao colo, agarra uma pomba que foi o emblema da Mãe-Criadora (ISHTAR), do Culto Fenício e Judaico.
Finaliza o Professor Moisés Espírito Santo concluindo que o culto Mariano tão arreigado no Baixo Mondego e nas Gândaras, teria as suas raízes profundas mergulhadas nos cultos primitivos descritos.
Há ainda o lugar de Bandorreira cujo topónimo parece indicar uma raiz de época lusitana que teria origem no culto das divindades dessa época conhecidos por Bandoga ou Banda-Reicus.
Na Idade Média, surge-nos a povoação de Ribeira dos Moinhos. Povoação isolada, do século XIII, abrangendo um vale fértil junto a uma ribeira, onde os moinhos e azenhas são aforados e a Ordem do Hospital, o Mosteiro do Lorvão e a Sé de Coimbra possuem diversas propriedades.
Em meados do século XV e no início da época dos Descobrimentos surge-nos a povoação da Carapinheira nascida da revolução passiva do milho, para só século XVII se constituir freguesia e paróquia ainda que sofregânia da de São Miguel de Montemor, atingindo a sua independência, no século XIX.
A referência escrita mais antiga da Carapinheira, não como freguesia, mas como localidade, sem indicação a que paróquia e termo pertencia, remonta ao século XV, em pleno reinado de D. Afonso V. De facto, a 16 de Junho de 1450 João Eanes, morador na Carapinheira, é nomeado por carta régia monteiro e guarda da mata da Botelha, junto ao lugar da Torre, em substituição de João de Buarcos por este ter acompanhado o Duque de Coimbra, o Infante D. Pedro, até Alfarrobeira (1).
Para o topónimo de Carapinheira encontramos várias explicações. Diz a lenda que os senhores da Quinta da Lavariz trouxeram de África como servos muitos negros para trabalhar a terra e se fixaram onde hoje se chama o lugar de Casais Pretos. A existência de escravos negros na Lavariz, com farta carapinha, teria dado aso aos povos da região chamarem à freguesia, que se constituiu mais tarde, a freguesia da Carapinheira.
Uma história apenas a juntar a tantas outras que povoam o Universo do nosso património lendário. Havia na povoação uma mulher chamada Pinheira, a qual na fogosidade da sua juventude vendia o seu amor. Só que todos se queixavam das suas exigências, e daí lhe chamaram Cara Pinheira, dando à povoação o nome porque tal mulher foi apelidada.
Outra mais plausível é de que o lugar se chamou primitivamente o «Casal da Clara Pinheira», por ali habitar uma mulher com esse nome. De Clara Pinheira, resultou o topónimo Carapinheira por junção dos dois nomes. De facto, o apelido de Pinheira ainda existia no princípio deste século na própria povoação, o que pode estar na base da lógica apresentada.
A Enciclopédia Portuguesa e Brasileira refere-se no entanto à Carapinheira dizendo que a denominação está relacionada por certo com a vegetação do meio, derivando o nome de carapinha por uma forma arcaica. Não admira que assim seja, até porque ainda hoje a freguesia é orlada em quase toda a sua periferia por floresta onde o pinheiro bravo lusitano é rei.
Teve o Alhastro o seu cemitério com a Capela dedicada a São Pedro, no pequeno monte a este do atual campo de futebol da Carapinheira, até ao século XVII.
É ainda no Alhastro que se ergue uma Capela chamada atualmente por Capela de Santo Amaro, reconstruída em 1692.
Em 24 de Abril de 1662, a Capela era conhecida por Ermida de São Jorge, conforme relata Francisco Correia Lopes.
A 13 de Julho de 1990, a Assembleia da República deliberou em reunião plenária a elevação da localidade da Carapinheira a Vila.